quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Arturito

Eu me interesso por restaurantes de donos argentinos. Não só porque sou argentina, mas também porque sei como nós somos capazes de produzir boa comida. Então resolvi ir atrás do Arturito (como o robô). Chegando lá, um mercedão-vidro-fumê, engravatados à porta, três manobristas e uma construção arrojada. Pensei "Ihh, é chicoso demais!". Nada contra a chicura, veja bem. Mas naquele dia, além do meu visual molambo-roots de aula de yoga e meu cartão de crédito não estar em sua melhor forma, eu não tinha ânimo para ambientes muito formais. Bom, morro de vergonha de ir até a porta e não entrar. Além disso, o amável hostess disse: "pode entrar para conhecer, fica a vontade", de um jeito que nos deixou a vontade mesmo, portanto, entramos. E depois que entramos, ficamos.




Salão do Arturito


Longo salão com mesas enfileiradas em ambos lados, como num típico bistrô mas com um pé direito muito alto e as paredes revestidas de madeira escura. Um lugar elegante, bem iluminado, agradável, talvez um pouco frio. Casa cheia. Sentamos. Notei que por alguma questão de acústica, o som das pessoas conversando vinha muito alto, um ambiente um pouco barulhento mesmo, mas não formal. Bem, ficamos um tempinho alí esquecidos até que chamei a garçonete e pedi um cardápio. Ela tomou um susto com a própria distração e se desculpou com o olhar.

No site do restaurante a chef Paola Carosella diz que cozinhar não é arte para ela e sim oficio e que tem mais interesse em nutrir e alimentar do que em surpreender. Eu me identifiquei com isso, mas na verdade achei o cardápio bastante sofisticado. E a porção uma coisa nouvelle cuisine só que um pouco mais generosa. Apresentação cuidadosa. De entrada, veio um pão caseiro, excelente! Fresco, cascudinho, gostoso, do preto e do branco. Manteiga com gosto daquela que se come na roça, caseirinha. Um azeitinho muito aromático com queijo ralado fininho e bolinhas de pimenta. Couvert simples e gostoso. Adorei. Fiquei de muito bom humor.

Como prato eu pedi o peixe do dia na chapa com batatas com erva doce, tomilho e limão siciliano. Muito bom! O peixe era pescada cambucú. A batata era a estrela do prato pra mim, meio confitada, crocante, delícia. Fui economizando e quando o peixe acabou ainda tinha uma batata inteira. Também veio ao lado uma espécie de maionese temperada, boa, mas eu não curto muito maionese. Meu amigo pediu um ravioli muito louco, com sálvia, limão siciliano, manteiga de aspargos, dill e laranja. Muito interessante, cheio de surpresas na boca (e a idéia dela não era surpreender). Sinceramente, acho esses molhos à base de manteiga um pouquinho enjoativos, mas provando de carona estava perfeito.

Agora abro um parênteses para falar do quanto as pessoas às vezes não tem noção do espaço que ocupam e do limite da invasão. Outro dia fui num show e uma mulher veio até onde eu estava e começou a dançar e fumar na minha frente, de costas pra mim, a 2 cm do meu nariz. Neste caso, o maître (será que é esse o nome do cargo dele?) ficou de costas pra gente, no espaço pequeno entre nossa mesa e os vizinhos, falando sobre as virtudes de um certo vinho. Mas ele estava perto demais, meio nos invadindo, a ponto do terno risca-de-giz, muito elegante, entrar em contato com nosso potinho de manteiga e deixar de ser imaculado.

Por falar em vinho, tomamos um vinho branco em taça argentino, Alamos, o mais barato das três opções. Estava ótimo e muito gelado, ótima temperatura e linda taça. Era um vinho levemente frutado, mas essencialmente seco. Senti nele aquela coisa levemente leitosa dos chardonnay, só que mais macio no paladar. Não sou grande entendedora mas apreciei muito esse vinho. Inclusive fiquei com vontade de voltar e provar aquele que o maître emanteigado recomendava, que combinaria com o ojo de bife do cardápio.

Aliás, ojo de bife que espiei porque é o que pediram as quatro pessoas sentadas à nossa esquerda. Dois casais, todos comendo a mesma coisa. Mulheres de um lado, homens do outro. Pessoas na faixa dos 35-40 anos. Homens com camisa social dentro da calça e cinto de couro combinando com o sapato náutico. Mulheres de cabelo muito liso e... cabelo muito liso. Do nosso lado direito, quatro casais, todos comendo coisas diferentes e tomando champagne e vinho tinto ao mesmo tempo. Todas as mulheres juntas numa mesa, todos os homens na outra. Conversas paralelas e claramente separadas. Pessoas na faixa dos 50-60, elegantes e discretos.

Esse foi um pouco o clima do Arturito nessa noite. Todas as ressalvas de que falei, mas o que importa, a comida, achei muito boa. O serviço, de modo geral, também. A conta, salgadinha, mas nada absurdo. Pena que fiquei muito satisfeita, porque tem uma sobremesa que vou ter que pedir um dia, e para isso vou ter que voltar: mousse ao chocolat Valrhona Guanaja com shortbreads de sal Maldon. Não parece delicioso, o que quer que seja?


MK, novembro de 2008

7 comentários:

fernanda disse...

Valrhona é a marca de um chocolate francês que é feito com grãos de cacau exclusivamente vindos da América do Sul e da Central, da Oceania e da África. O Guajana acho que é o mais escuro e mais amargo. Coisa mais do que fina. Shortbread é um biscoito escocês originalmente feito de açúcar, manteiga e aveia. É um tipo de biscoito muito comum e muito consumido no Reino Unido. Sal Maldon é um sal marinho em cristais, o mais puro do mundo que vem só das salinas de Essex, chique no último. Eu não entendi se o Shortbread é feito de Maldon ou se os cristais do Maldon vem em cima da sobremesa. Até hoje, eu só provei Shortbread doce. Uma vez, eu comi em Buenos Aires um passadinho de chocolate que vinha coberto de azeite de oliva, azeite de baunilha e cristais de Maldon, muito gostoso como essa sobremesa deve ser. Talvez, a mousse venha com Shortbread e Maldon por cima. Eu fiquei pensando por que o nome Arturito, será mesmo, santo Jedi portenho, por causa de R2-D2. Palermo Viejo parece estar por trás desses novos restaurantes argentinos que estão povoando São Paulo com carnes e dulces tão saborosos. Meu preferido aqui é o Estación Sur que tem um jeito mais tradicional e inova com empanada vegetariana.

Natalia Mallo disse...

Quem sabe, sabe, né gente?
Arturito há de ser porque fica na Artur de Azevedo...

Obrigada pelas infos!

Agora eu quero!

Aliás, agora lembro que já comi muito shortbread nessa vida...

fernanda disse...

Arturito é por causa da Artur de Azevedo. Oh, desfez minha fantasia. Eu fiquei imaginando os donos do restaurante fazendo uma convenção de Guerra nas Estrelas no Arturito. Darth Vader e Luke Skywalker comendo um Bife de Chorizo à Martín Fierro.

Natalia Mallo disse...

Aquelas espadas dariam um bom espeto...

Moriah disse...

Dah totalmente vontade de visitar o Arturito! :)

Mariá disse...
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A Macaca - Instituto de Iyengar Yoga disse...

Oi, Miss Kitchen!

Que blog interessante o seu :)

Sobre o seu questionamento, estávamos ainda organizando a grade de professores para assumir as aulas de domingo. Até o final do ano, estão confirmadas essas aulas, das 12h-13h30:
Dia 7/12: Renata Ventura
Dia 14: programação especial pelo aniversário de Iyengar, com diversas aulas ao longo do dia
Dia 21: Karina Grecu.

Aguardamos você!