domingo, 28 de fevereiro de 2010

Lembrança



Lembro como se fosse hoje.
Tinha 7 anos. Eu era a primeira a dormir e a primeira a acordar na casa (ainda sou assim).
Dormia muito cedo, muitas vezes antes do jantar.
Acordava cheia de disposição às 5 da madrugada e, entediada pelo silêncio da casa, me dedicava às minhas duas atividades preferidas: ler (livros proibidos da bibliotéca do meu pai, aqueles bem no alto) e cozinhar (comer).

Na cozinha treinava minha autonomia alimentíticia. Às vezes preparava um farto e variado café da manhã e ficava esperando a casa acordar, não sem uma certa impaciência. A noite virava dia e eu na cozinha. Inventava coisas, assava biscoitos de água e sal no forno, com cebola picada e cobertos de queijo Port Salut. Fazia ovos mexidos vermelhos com pimentão. Preparava chai pra o meu pai e earl grey com limão para o resto. Inventava maneiras de apresentar as frutas, de acomodar rodelas de salame numa tábua. Ralava cenoura. Arrumava a mesa nos mínimos detalhes e ficava esperando.

Mas nessa manhã que lembro como se fosse hoje aprendi a fritar um bife à milanesa.
Coloquei o óleo na frigideira, liguei o fogo e joguei o bife (que já estava pronto, numa pilha na geladeira). Nada aconteceu. Algo estava errado. Precisava ter esperado mais. Mas fritei até o fim, e não ficou bom. Joguei fora e comecei de novo. O óleo (de milho) ficou tão quente que ao jogar o bife, pingos de óleo queimaram meu rosto. Soltei um gritinho e tampei a boca. Esperei um pouco, de olho na frigideira mas mantendo distância, virei, virei de novo, mais uma vez. Torradinho por fora, mal passadinho por dentro. Perfeito. Comi no pão ("flauta" a baguette argentina) que esquentei no forno, com mostarda, lendo um Asterix e tomando Tang sabor laranja. Depois dormi de novo e quando acordei já era dia e a casa estava de pé antes de mim.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Oasis

Você sabia que existem alguns lugares muito especiais para onde você pode fugir de encontro à natureza, e de quebra receber boa comida e ótima música? São espaços concebidos por pessoas muito singulares, que acabaram criando um conceito muito inteligente e cada vez mais difundido (um conceito que me faz muito feliz). A idéia é proporcionar, fora de São Paulo, uma programação cultural valiosa, aliada ao fato de se estar em lugares lindos, a um extremo cuidado gastronômico e ao cultivo do descanso, da privacidade, do cuidado e do amor com a gente mesmo. Isso tudo representa uma maneira não só de fugir da loucura paulistana, mas também de sobrevivê-la.



 Ovos Joly


Há pouco tempo estive cantando num lugar desses, o Hotel Maison Joly, na Ilha Bela. É um casarão maravilhoso, no alto de um morro, perto da Vila, de onde se vê o canal de São Sebastião, o continente, os barcos, os veleros, os pássaros e os peixes. Eles te recebem com muitos cuidados e sem nenhuma frescura desnecessária. A equipe transpira o gosto que tem de trabalhar por lá. Os proprietários tem bom gosto e são extremamente inventivos, sobretudo no que diz respeito à gastronomia. Você pode experimentar (no farto e delicioso café da manhã), os ovos Joly, emoldurados num pão de forma fresquinho e macio, e servidos numa louça primorosa. Ou então comer uma salada de salmão marinado, servida num prato de gelo, e acompanhada de um ótimo vinho. São detalhes, mimos, carinho. E a mim,  que estava lá na qualidade de artista convidada, e que algumas vezes vi contratantes fazendo questão de oferecer "menos" ao músico do que ao cliente, me foi oferecido todo esse cuidado e tratamento amoroso, respeito puro. Os shows acontecem num lounge de frente ao mar, com ótimo som e um ambiente onde se respira música. Uma experiência única. Recomendo! Só neste mês teve Toninho Ferraguti, gatoNegro e Amilson Godoy.


Palco do Photozofia


Outro lugar que adoro e frequento desde que inaugurou há coisa de cinco anos é o Photozofia, em São Francisco Xavier. Um lugar que nos oferece a possibilidade de tocar para uma platéia de gente interessante e interessada, num espaço muito bonito, construido à base de demolição e reciclagem. O espaço é misto de café, restaurante, teatro, livraria e cyber café. Lindo e com uma programação imperdível. O pôr do sol na janelona dos fundos é a coisa mais incrível. O interessante desse lugar é que lá a gente não só faz um show, mas por vezes é também palco dos nossos laboratórios, onde podemos testar novos projetos, criar shows especiais, encontros, essas coisas que nos alimentam artísticamente. Gosto de tomar uma sopa tailandesa com shiitake ou uma bela massa, acompanhada de um ótimo vinho argentino.


Pãozinho caseiro no Ponto de Luz


Mais um exemplo que não pode faltar é o Ponto de Luz, em Joanópolis. O hotel fica no meio da montanha e tem cachoeira, piscina (aberta e aquecida), refeições naturais e orgânicas de dar água na boca e uma belíssima sala de meditação onde também acontecem os shows. O legal é que aqui você se da um trato. O espaço oferece uma variedade de terapias incluindo massagens, pedras, reflexologia, watsu, todas essas coisas que nos ajudam a viver. Já na estrada de terra que leva até lá, nos sentimos a caminho de nós mesmos. O tratamento também é amoroso, respeitoso e acima de tudo, generoso.

Estes três lugares não são os únicos, vale a pena descobrir outros, mas eu vejo como parte de um movimento. Como um dos idealizadores me disse: aqui trocamos nosso melhor pelo melhor de vocês. O acolhimento e o descanso por um pouco da nossa música. Uma troca justa onde todo mundo sai ganhando, principalmente o hóspede. Faça isso por você!


MK, fim de janeirão de 2010