segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Voltei

Eu sumi, é verdade. Mas isso não quer dizer que não comi, não cozinhei ou não pensei em comida todos os dias, umas quatro vezes ao dia, no mínimo. Fiz muitas coisas desde o carnaval, o ano começou cedo, começou rápido, e a impressão que dá é de que não vai dar tempo (não sei do que, mas não vai dar tempo). Por exemplo, fico pensando nos tantos projetos em andamento, inacabados, nunca começados. Coisa demais. E tudo que a gente quer fazer além do que a gente já faz? Eu, por exemplo, queria ter mais tempo (e tranquilidade) para estudar piano. E você? Mas o que a gente faz ocupa quase o tempo todo, e no tempo que sobra, pelo amor de Deus, não fazer nada! Ou então, cozinhar, uma atividade que se justifica por si mesma, já que sem comer não se pode fazer mais nada.



Almoço de domingo.



Essa coisa desfocada é um badejo assado com ervas. As ervas são salvia, estragão, tomilho, coentro e salsinha. Tudo fresco. Não é uma combinação que eu inventei, mas uma bandejinha que gosto de comprar, chamada "ervas para peixe". Praticidade é uma coisa que tem consequências nefastas, mas às vezes funciona. O acompanhamento: purê de batata doce. Tem gente que pronuncia "pirê", que seria uma proto-pronuncia francôfona abrasileirada. Eu sou do tipo que fala "purê", sem medo de não soar chique. Na verdade é tudo questão de hábito. A minha amiga de sobrenome quatrocentão fala "pirê" e não é nem um pouco esnobe, questão de hábito.



Badejo antes de assar.



Untei o peixe com uma mistura de alho espremido e azeite extra-virgem. Cortei por cima as ervas, com tesoura (adoro cortar ervas com tesoura), sal, pimenta e assei no forno bem quente por 20 minutos. Ficou muito bom.



Salada incrementada.


Mas antes do peixe, quis uma salada "incrementada". Fiz em camadas: alface americana, alface roxa, rúcula, endivias, tomate e aspargos cozidos no vapor. Na Argentina só se come o aspargo branco (que quando cozido fica roxo na ponta), e eu acho mais gostoso, mas esse é muito bom também. Tempero simples: azeite de oliva, limão caipira, sal e pimenta moida na hora.

...

Na semana anterior, viajei a trabalho para São João da Boa Vista. Na verdade um mix de trabalho e prazer. Sobretudo quando se trabalha olhando as mangas que caem perto da piscina e sentindo o cheiro da próxima refeição, vindo da cozinha de Dona Rita. Tem um sabor tão especial a comida feita (e ingerida) numa fazenda! Fora o mimo de ter alguem preparando tudo e te chamando quando está pronto. Uma raridade na minha vida. A Rita tem aquele tempero roots sem medo de ser feliz, o filé acebolado tem muita cebola, o feijão super gostoso, o arroz branco feito na hora com alho picadinho, e a abobrinha, que não pode ser simples abobrinha cozida, tem que ser recheada de frango desfiado e gratinada no forno com bastante parmesão. Tudo muito bom. Só o macarrão com linguiça foi um pouco forte demais para mim. Não sou puritana ao ponto de querer proibir o molho Pomarola, mas não consigo pensar num tempero que venha por cima do que ele tráz de fábrica. Fica meio "over temperado", deixa uma coisa ácida no fim, e muita sede.




Comida da fazenda, nesse caso incluindo arroz integral cateto.



De volta em São Paulo, dias quentes. Francamente prefiro São Paulo nublado (ou devo dizer nublada?, nunca sei...). Mas sem o sol e o calorão trabalho melhor. Ao mesmo tempo, é claro que um dia de sol incentiva uma alegria de viver na gente, é anti-depressivo mesmo, e eu gosto também. Além disso, inspira uns lanches de verão bem legais, como o melão cantaloup com presunto crú e ameixas que me permiti numa tarde dessas. Hoje descobri que o melão é excelente para eliminar os sais do corpo, o que por sua vez ajuda a prevenir a retenção de liquidos, um mal que afeta muito nós mulheres.




Melão cantaloup com presunto crú e ameixas.


E entre uma correria e outra, uma visita ao meu querido e clássico Martin Fierro. Vá até lá agora! (Rua Aspicuelta, Vila Madalena), e peça o seguinte: bife a milanesa, purê de batata, salada primavera (com abacate em vez de manga), uma taça de Malbec (o que eles tiverem será bom), uma água com gás, um café carioca e um alfajor de maizena. Desculpem se estou me repetindo, mas é A Refeição Perfeita. Se puder dormir um pouquinho depois, melhor ainda. Eu nunca posso e quando posso não consigo.



A refeição perfeita.


E nos raros finais de semana em que escolho ficar na cidade, ou em que não tenho opção, tem uma ótima alternativa para comer coisas ibéricas (portuguesas e espanholas). O Restaurante Adega Santiago, que fica na Rua Sampaio Vidal, onde antes tinha o "Pharmacia". O lugar é pequeno e costuma encher. Às vezes a gente sai de lá cheirando um pouco a grelha, mas a comida vale muito a pena. O ambiente criado pelo arquiteto Carlos Mota também, simples bonito e aconchegante, como tudo que ele faz.

Qualquer um dos grelhados (badejo, salmão, frutos do mar, costela de cordeiro, cortes vermelhos), com qualquer acompanhamento (legumes assados, batatas ao murro, etc), será uma boa escolha. As saladas, os sanduiches, o gazpacho, e tudo de que consigo me lembrar é ótimo. O atendimento também. Mas acho que a estrela é a bacalhoada, que diz ser pra dois, mas serve tres tranquilamente. Pelo menos tres mulheres...



O que restou da bacalhoada.



E para finalizar, uma troglice total! Churros, com "dips" de chocolate e doce de leite para mergulhar. Eles vem quentinhos, crocantes e com uma crostinha deliciosa de açúcar e canela. Uma delicia. Em pleno domingo na cidade, uma festa. Depois disso, filminho, no cinema ou em casa. Ser feliz não é impossível!



Coma sem culpa pra não cair pesado.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Carnaval é fogo

Nem foi um carnaval dos mais chuvosos. E mesmo assim, quase não desgrudamos do fogo. O da lareira, onde ficamos feitos lagartos indoor exercendo a preguiça e lendo livros variados (de Oliver Sacks à vida do Henfil, passando pelos mistérios de P.D. James e a áfrica de Mia Couto); e o do fogão a lenha, onde passei um bocado de horas cozinhando e onde tomavamos café da manhã.


Café da manhã.



Na minha opinião, o carnaval é parente das festas cruéis de fim de ano. Durante a dupla Natal & Reveillon, nos sentimos -meio- obrigados a uma felicidade em familia que inclui presentes, comilança e disposição. Às vezes essa felicidade está acontecendo mesmo e é ótimo! Em outras, sumir. E tem carnavais em que só se quer passar bem, longe da folia.



Torta, antes de assar.



O sitio produz muita abobrinha, e no primeiro dia resolvi tentar uma torta. Não sou boa para massas de maneira geral, nem pra bolos ou doces, exceto panquecas. Minha praia é rango. Mas lembrando vagamente uma receita vista em algum lugar, arrisquei uma massa de torta feita de farinha, óleo, um ovo inteiro e água. Assei e virou um biscoito, tipo água e sal, meio dura. Ao menos era sequinha. O recheio: abobrinha refogada com cebola, misturada com 2 ovos caipiras recem botados, batido com leite da vaquinha, temperado com sal, pimenta e queijo Prima Donna. Coloquei para assar/gratinar e abri um vinho.






Ficou um pouquinho seca (me distrai com o vinho), mas ficou bonita. O gosto estava bom. As fatias fininhas de presunto defumado por cima deram um toque. Comemos com arroz integral e salada da horta. Mas antes disso, quis servir uma entradinha extraida de um livro sobre culinária grega, que consiste em figos recheados de queijo feta, manjericão e tomate. Na versão sul-mineira: meia cura cremoso, orégano fresco, tomate, sal e alho, mas regado de azeite grego Minerva.



Nada mal, com araucárias ao fundo



Num outro dia, fiz um prato típico meu. É um prato que ficou consagrado pelos 10 gatos pingados que o provaram, o Cordeirinho. São costeletinhas assadas numa marinada de ervas frescas (menta ou hortelã, sempre) e alguma bebida como cachaça, conhaque ou rum, ou... Não lembro quantas vezes fiz e é sempre muito bom. Mas desta vez, na hora de abrir o pacote vi que a carne tinha vencido... óntem. Era só um dia, o aspecto e o cheiro estavam bons, consultei os envolvidos e, de comum acordo, resolvemos arriscar. De fato, a carne estava em bom estado, todo mundo comeu, e ninguém passou mal. Eu não comi.


Na verdade nunca acreditei no prato, fiquei deprimida desde o inicio pela imoralidade sanitaria que estava cometendo e preparei desconfiada, asséptica, sentindo culpa e olhando o forno com curiosidade clínica. A carne estava boa, mas eu gorei o prato com minha desconfiança. Nunca devia tê-lo feito. Tenho vergonha de contar isso. E é claro que não ficou bom. Eram costeletas tristes e acanhadas desmaiadas na travessa, e não suculentas, irresistíveis e obscenas costeletinhas derretidas em seu molho, como de costume. Como cozinheira, um erro fatal. Não repetí-lo virou questão de honra.


...


Antes de voltar pra casa, fechamos o carnaval com chave de fenda. Um lanchinho improvisado com restos de geladeira, salada, arroz integral, ratatouille e ovo caipira frito. Uma delicia. O Prima Donna foi parar dentro da salada junto com o presunto defumado e o arroz virou uma papa deliciosa misturada aos sucos do ratatouille, e no centro aquele ovo solar regado de sal e pimenta preta recem moida.




Sem palavras